Poesia de mulheres em tradução no Brasil
Por Marlova Aseff
As poetas mulheres ainda são muito pouco traduzidas no Brasil. Dados de dezembro de 2023 extraídos do nosso catálogo indicam que apenas 14% da poesia traduzida no Brasil é de autoria feminina (o número refere-se a edições em volumes únicos, sem contar publicações em antologias mistas). As hispano-americanas são ainda menos traduzidas do que as de língua inglesa. No entanto, no campo específico da poesia hispano-americana, começa a ser sentida uma espécie movida cultural de traduções das poetas e que estão enriquecendo o repertório poético a que temos acesso no Brasil.
Um exemplo é Alfonsina Storni, que pela primeira vez recebeu traduções integrais de sua obra no Brasil em três volumes lançados em 2020: Sou uma selva de raízes vivas (Iluminuras), traduzido por Wilson Alves-Bezerra, Poemas de amor (Coragem), por Pedro Gediel, e Antologia poética (Coragem), em tradução de Ezequiela Scapini. A chilena Gabriela Mistral costuma figurar apenas em antologias e até 2018 só tinha recebido uma tradução integral dedicada à sua obra (uma edição de 1964 sob os cuidados da poeta e tradutora Henriqueta Lisboa). [Essa tradução, me informa o Sérgio Karam, foi novamente editada em 2022 pela Peirópolis.] Em 2019 surgiu Balada da estrela e outros poemas (Olho de Vidro) e, em 2021, A mulher forte e outros poemas (Pinard).
Por sua vez, a interessantíssima poeta argentina Alejandra Pizarnik recebeu cinco traduções nos últimos anos: em 2017, em iniciativa pioneira de uma editora de Fortaleza, Árbol de Diana surgiu em tradução da poeta Nina Rizzi e, nos anos seguintes, entre 2018 e 2020, houve quatro lançamentos pela mineira Relicário, todos traduzidos por Davis Diniz. Também Nina Rizzi, em 2022, traduziu Habitante do Nada & distâncias, da poeta argentina Susana Thénon (Editora Moinhos). Dirce Waltrick do Amarante me alerta para a tradução de Cecilia Vicuña por Ricardo Corona, publicada em 2017 para a editora Medusa e conta ainda que uma nova tradução da poesia desta chilena está no prelo pela Iluminuras, em tradução da própria Dirce.
Entre as poetas hispano-americanas traduzidas mais recentemente no Brasil são as uruguaias Delmira Agustini e Ida Vitale, as argentinas Tamara Kamenszain, Natalia Litvinova, Carina Sedevich, a mexicana Carol Bracho e a chilena Julieta Marchant. Uma iniciativa muito interessante é a da editora sediada em Porto Alegre Escola de Poesia, com o projeto Orisun Oro, que publicou as poetas “amefricanas” Georgina Herrara (Cuba); Mayra Santos-Febres (Porto Rico) e Graciela González Paz (Argentina).
Entre as poetas de todas as literaturas, certamente a autora mais traduzida por aqui segue sendo Emily Dickinson, que tem pelo menos 15 edições de sua poesia publicadas no Brasil, sendo que nos últimos anos, teve a sua obra completa lançada pelas editoras da UnB e da Unicamp em dois grossos tomos traduzidos por Adalberto Müller. Agora, em 2023, devo destacar o lançamento de Poesia reunida (Companhia das Letras), de Sylvia Plath, uma seleção de 40 poemas em edição bilíngue, traduzido pela poeta Marília Garcia. Plath já tinha recebido traduções do livro Ariel pelo poeta Rodrigo Garcia Lopes em parceria com Maria Cristina Lenz de Macedo (Editora Verus, 2007, reeditado em 2018) e, depois, em uma parceria de Lopes com Mauricio Arruda Mendonça, foi lançado Poemas (Iluminuras, 1991). Ronaldo Polito e Deisa Chamahum Chaves também traduziram XXI Poemas, em edição de 1994 reeditada em 2019. Outra poeta que faz muito sucesso no Brasil é a polonesa prêmio Nobel de Literatura Wisława Szymborska, que teve quatro obras lançadas pela Companha da Letras em 2011, 2016, 2018 e 2020, além de ter seus poemas em pelo menos quatro antologias. Aliás, o Nobel de 2020 para estadunidense Louise Glück impulsionou o lançamento de dois volumes dedicados à sua poesia (Companhia das Letras 2021 e 2022), em tradução de Marília Garcia, de Bruna Beber e da saudosa Heloisa Jahn .
Outros destaques da poesia de mulheres traduzida nos últimos anos são o belo O tempo adiado e outros poemas, da poeta, romancista, tradutora, ensaísta e dramaturga austríaca Ingeborg Bachman em tradução de Claudia Cavalcanti (Todavia, 2020), a francesa Liliane Giraudon, em tradução de Marcelo Jacques de Moraes e Inés Oseki-Dépré (7Letras, 2022), e Trobairitz: vozes femininas da poesia provençal, traduzido por Guilherme Gontijo Flores pela Chão da Feira em 2022. Também merecem atenção a tradução de Poesia Completa da escritora, poeta e ativista dos direitos civis dos afro-americanos Maya Angelou, pelas mãos da poeta-tradutora Lubi Prates em 2020, e, lançado agora em 2023 pela Companhia das Letras, a tradução de Um bom choro, de Nikki Giovanni, que também é uma poeta e ativista afro-americana. Em 2023 também houve o lançamento de Compaixão, da poeta norte-americana Anne Sexton, em tradução de Bruna Beber (Relicário) e Saber seduzir a carne a palavra, da italiana Patrizia Valduga, por Elena Santi e Agnes Ghisi (Jabuticaba). Outra italiana que aportou no Brasil foi Maria Grazia Calandrone, lançada pela Urutau em 2022 com tradução de Patricia Peterle.